2019

Cesar Callegari

A escola é um território dos afetos. Um lugar para as múltiplas experimentações, encontros e descobertas. Um espaço da vida, de aprendizado e de criação autoral. Muitas coisas essenciais que se aprende na escola não estão nos livros, mas nas relações próximas entre estudantes, seus professores e a comunidade. É nesse ponto de convergência diária, regular e socialmente reconhecido que os jovens podem desenvolver uma consciência mais profunda sobre si próprios e sobre a sociedade, aprender a trabalhar com as diferenças e exercer uma cidadania ativa. Portanto, não serão isolados, a distância, trancados nos seus quartos e atrás de uma tela, que as pessoas desenvolverão capacidades como a de exercitar a empatia, o diálogo e a resolução de conflitos; nem tampouco os sentimentos de solidariedade, a capacidade de trabalhar de forma colaborativa, a resiliência, o apreço à paz e à democracia. Porém, como quase tudo, a educação escolar também é afetada pelas inovações.

Um dos campos mais pulsantes e criativos em desenvolvimento nos últimos anos é o da aprendizagem. Estamos vivendo uma espiral ascendente em que a melhor compreensão dos mecanismos biológicos da cognição, a criação de novos métodos, a democratização do acesso a conteúdos e o desenvolvimento das tecnologias abrem um campo fascinante a ser explorado por educadores e estudantes. A possibilidade de realizar processos colaborativos de aprendizagem nas plataformas adaptativas; as experimentações imersivas possibilitadas pela realidade aumentada; o acesso ampliado aos conteúdos e redes trazido pela computação em nuvem; a possibilidade de tomar decisões mais assertivas trazidas pela análise de dados educacionais – são possibilidades que desafiam as formas tradicionais de ensinar e aprender.

Tudo isso deverá significar aproximação, jamais distância e isolamento. Tampouco o enfraquecimento da escola e, muito menos, um fator de redução de direitos dos estudantes e seus professores, sobretudo o direito à convivência. É certo que a escola vem deixando de ser o principal meio de acesso à informação para ser o local onde o conhecimento é construído de forma colaborativa e autoral por crianças, jovens e adultos, a partir da formação do pensamento crítico e criativo. Isso se faz juntos, próximos, com a participação de profissionais da educação, construindo vínculos humanos significativos e habilidades necessárias para o exercício da cidadania contemporânea. Tudo aquilo que fustiga essas conexões, agride a educação humanista que queremos.

A Lei nº 13.415/17 do “novo ensino médio”, criada a partir de medida provisória de Michel Temer, não só abre, mas escancara a educação secundária para que seja oferecida a distância. Se a lei avançar, pacotes EAD poderão dispensar professores, laboratórios e bibliotecas, aniquilando espaços de vivência presencial e experimentação coletiva. Por esse e outros problemas, essa lei precisa ser revogada. As novas tecnologias devem fortalecer a escola, não substituí-la.

A educação básica precisa ser face a face, próxima. Educação a distância não deve ser admitida a não ser em casos excepcionais. Crianças e jovens têm o direito a uma experiência escolar completa, intensiva e extensiva, incluindo o acesso às novas tecnologias. Assim se tornarão cidadãos do mundo.

Cesar Callegari é sociólogo, membro do Conselho Nacional de Educação e Presidente do Instituto Brasileiro de Sociologia Aplicada.