Uma sensação de desalento ronda a juventude brasileira. Motivos não faltam e causas são muitas. À pandemia, crise econômica, política e de valores soma-se uma percepção generalizada de que um diploma universitário já não garante muita coisa.
Para Muitos Jovens, não faz mais sentido correr atrás de um diploma
(publicado no jornal Folha de São Paulo em 7/11/2021, a propósito da queda do número de inscrições para os grandes vestibulares e o ENEM)
Além das altas taxas de desemprego estrutural que atingem amplos setores da economia restringindo oportunidades, as organizações são cada vez mais rigorosas ao apurar as reais competências dos candidatos a uma vaga. São cobrados conhecimentos e habilidades raramente proporcionados pela maioria dos cursos superiores, principalmente aqueles oferecidos por instituições particulares de baixa qualidade. O resultado vê-se em toda parte: engenheiros, economistas e tantos outros diplomados tentando seu ganha-pão em ocupações precarizadas que nada têm a ver com sua formação. Diante a esse quadro, muitos jovens começam a questionar se vale a pena tanto esforço por um diploma. Isso pode explicar, em parte, a queda acentuada de inscrições para os exames vestibulares e para o ENEM, bem como a alta evasão registrada em cursos universitários.
Claro que os impactos da pandemia sobre o sistema educacional influenciam, atingindo principalmente os jovens em situação de maior vulnerabilidade socioeconômica. Os quase dois anos de paralisação das atividades presenciais nas escolas e a dificuldade de acesso aos meios remotos de educação fazem com que muitos estudantes se sintam despreparados para enfrentar o desafio das provas. Mas isso não explica tudo.
Falta ao Brasil uma política para a juventude. A começar por uma verdadeira reforma do ensino médio que dê sentido e significado para a educação superior. As recentes iniciativas nessa direção não passam de um arremedo de reforma. Muita propaganda, nada aconteceu e pode piorar. Acenam com opções vocacionais que, na prática, não serão oferecidas, face à pobreza de condições da maioria das escolas. Criam uma ilusão de profissionalização onde não há laboratórios, internet, professores habilitados e com salas de aula superlotadas. Reduzem os direitos de aprendizagem ao que couber em parcas 1800 horas, limitando as possibilidades de uma formação crítica e criativa tão demandada nos dias de hoje. Assim, por se tratar de pura miragem, geram maior frustração, especialmente entre os alunos de escolas públicas desconfiados que o ensino superior não vai resolver os déficits acumulados no nível básico. Isso precisa mudar.
Todos sabem que o futuro de um país depende de seus jovens. E as juventudes necessitam de um horizonte que hoje o Brasil lhes nega. É possível e urgente construí-lo com educação básica e superior de boa qualidade, sustentadas por investimentos vigorosos e continuados que garantam acesso e permanência para todos. Com uma visão ousada e inclusiva de construção de futuro. Com políticas de ingresso no mundo do trabalho que combatam frontalmente a precarização e que se articulem às necessidades estratégicas do país.
O interesse pela educação superior está associado a um projeto de nação que, entretanto, ainda nos falta. Que seja inclusiva, democrática, desenvolvida e socialmente justa.
Cesar Callegari é educador e sociólogo, Presidente do Instituto Brasileiro de Sociologia Aplicada.
Foi Secretário de Educação Básica do MEC (Governo Dilma) e Secretário de Educação do Município de São Paulo (gestão Haddad).