Cesar Callegari
Artigo publicado no Jornal Folha de São Paulo, em 03/06/2015
É alarmante! Embora previsíveis, os resultados da primeira edição da ANA (Avaliação Nacional de Alfabetização) realizada no final de 2013 pelo Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais) mostram a dimensão do principal desafio da educação brasileira: a alfabetização de suas crianças.
Foram testados os conhecimentos e habilidades em leitura, escrita e matemática são 2,6 milhões de estudantes concluintes do terceiro ano do ensino fundamental em 55 mil escolas públicas.
A ANA revela que 1 em cada 4 alunos chega a essa fase sem saber ler ou fazer operações matemáticas elementares como somar e subtrair. E quase 45% não sabem escrever corretamente um texto simples.
A situação é muito mais grave nas regiões Norte e Nordeste onde cerca de 40% não têm proficiência esperada em leitura e matemática e quase 60% apresentam deficiências em escrita. Aos oito anos de idade, portanto, já estão sujeitos a enfrentar sérias dificuldades na sua trajetória educacional e de vida.
Essa é a principal raiz da desigualdade e da exclusão social. Enquanto metade das crianças alagoanas não sabe ler quando terminam o terceiro ano, essa proporção cai para 10% em Santa Catarina. No Pará, ao fim desse ciclo, 70% dos alunos ainda não sabem escrever, ao passo que em São Paulo o desastre atinge 31%, o que já é muito grave.
O que esperar de um país que nem sequer consegue alfabetizar todas as suas crianças? É tão difícil fazer isso? Que futuro terão esses meninos e meninas cujos direitos de aprendizagem e de desenvolvimento são sonegados?
Já cientes dessa gravíssima situação, em 2012, o governo federal, Estados e municípios firmaram o Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa (PNAIC). É um conjunto de medidas para assegurar a alfabetização com a implementação do letramento de todas crianças brasileiras até os oito anos idade.
Em parceria com universidades públicas, um gigantesco programa de apoio e formação continuada para 314 mil professores alfabetizadores passou a ser colocado em prática. Foi definida uma base curricular nacional comum e, a partir dela, produzidos e distribuídos livros, material didático específico e bibliotecas de literatura infantil para todas as escolas públicas.
Também foi estabelecido um sistema de monitoramento, a ANA, que é censitário e que é realizado anualmente. Os relatórios com informações detalhadas são devolvidos às escolas para que os educadores possam trabalhar revendo suas estratégias e projetos pedagógicos.
No entanto, deve-se perguntar: Será que isso está sendo feito adequadamente? Quais atitudes têm sido tomadas a partir do exame desses dados? As secretarias de Educação e as universidades estão atentas e fazendo a sua parte? Os resultados da mesma avaliação realizada no fim de 2014 haverão de revelar os progressos já alcançados e o esforço a ser feito.
É certo que houve avanços, mas é de se presumir que o quadro ainda seja crítico e que seu enfrentamento vai requerer maior empenho e atenção obsessiva. É necessário radicalizar as iniciativas do PNAIC com medidas enérgicas e mais ousadas que envolvam os governos e também as famílias, demais instituições, enfim, toda a sociedade.
Como se sabe, a alfabetização é a pedra angular de todo processo educacional. Se ela falha, o resto do caminho fica comprometido. Alfabetizar todas as crianças na idade certa é a postura que se espera de uma “pátria educadora”.
CESAR CALLEGARI, é sociólogo e membro do Conselho Nacional de Educação. Foi Secretário de Educação Básica do MEC, responsável pela organização do PNAIC em 2012 e Secretário Municipal de Educação de São Paulo (2013/2014). É presidente do Instituto Brasileiro de Sociologia Aplicada – IBSA – www.ibsa.org.br